Ministro Dipp fala do papel do Conselho Nacional de Justiça


"Os juízes devem ter altivez nas relações com os outros agentes de poder político e humildade na hora de atender aos jurisdicionados"

O Ministro Gilson Langaro Dipp, Corregedor Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça – CNJ, concedeu entrevista exclusiva à Revista Direito Militar da Associação dos Magistrados das Justiças Militares Estaduais – AMAJME.  Reproduzimos a seguir, na íntegra, as questões e as respostas do Magistrado.

Direito Militar - Vossa Excelência sabe que na discussão da EC nº45, a AMB e outras entidades associativas de magistrados tinham posição contrária à criação do Conselho Nacional de Justiça. Hoje, esse órgão é uma realidade. Se pudesse fixar um grande objetivo atingido pela atuação do CNJ, qual seria esse destaque?

Gilson Dipp - Difícil escolher alguma realização do CNJ em meio a tantas realizações importantes para os brasileiros. Penso que haja duas linhas: eficiência administrativa e boa qualidade ética. Nesses dois eixos produziram-se melhorias significativas no Judiciário que, além de poder, é serviço. Os juízes devem ter altivez nas relações com os outros agentes de poder político e humildade na hora de atender aos jurisdicionados.

Na seara administrativa, o estabelecimento de metas para julgamento de processos antigos (a denominada meta 2), de padrões de informatização mínima dos Tribunais, de cadastro nacional de bens apreendidos, de adoção, mostraram que é possível produzir mais e melhor com os recursos existentes. A compilação de informações no Justiça em Números e no Justiça Aberta, iluminou a produção e a produtividade do Judiciário e de cada um dos seus membros; é sabido, a luz do sol é o melhor detergente.

As inspeções realizadas pela Corregedoria Nacional de Justiça trouxeram a lume as boas e as más práticas de Tribunais de todos os cantos de Brasil, relatando as constatações e determinando mudanças e modernizações que, certamente, resultam em melhora da qualidade do serviço judicial. Por ocasião das inspeções, realizaram-se audiências públicas para que o povo pudesse falar diretamente a seus juízes, expondo de modo intensamente emocional, humano, a carência de justiça, a tristeza provocada pela morosidade, o inconformismo com a dúvida sobre a imparcialidade de alguns julgadores.

No aspecto disciplinar, o norte da ação tem sido a convicção de que os jurisdicionados têm o direito a julgamento por magistrados de reputação ilibada. Nessa direção, a Corregedoria Nacional de Justiça teve aumento expressivo de reclamações contra a demora no andamento de processos, alcançando quase dez mil em menos de dois anos e as sindicâncias e processos administrativos e disciplinares produziram efeitos que estão na memória das pessoas, com a aplicação de penalidades administrativas, inclusive o afastamento definitivo do cargo (aposentadoria compulsória) a muitos desembargadores e juízes.

Creio, o que já foi feito demonstrou que é possível fazer mais, levando o serviço judiciá­rio brasileiro a excelência esperada pelos ci­dadãos. Assim, o principal objetivo alcançado foi provar que a má qualidade do serviço público não é fado, é fato que pode ser mudado por meio de esforço para a vigência efeti­va dos princípios da nossa Repú­blica.

 

Direito Militar - Para o pleno êxito do CNJ é importante uma relação harmoniosa com o Supre­mo Tribunal Federal. Embora o CNJ seja presidido pelo presiden­te do STF, alguns dos Integrantes da Corte Suprema têm criticado publicamente atos do Conselho? Qual a previsão para o futuro com o Ministro Cesar Peluso, que assumirá a pre­sidência da Corte?

Gilson Dipp - A expectativa é de consolidação das atividades do Conselho Nacional de Justiça como órgão de aprimoramento da Jus­tiça brasileira.

 

Direito Militar- No ano de 2009, V. Excia. fez uma inspeção na Justiça Militar do Esta­do do Rio Grande do Sul. Qual o resultado dessa inspeção e quais as conseqüências para a Justiça Militar brasileira e/ou para a Justiça Militar estadual?

Gilson Dipp - A inspeção na Justiça Militar Estadual do Rio Grande do Sul não diferiu da­quelas realizadas em vários outros Estados da Federação, em primeiro e segundo graus, em órgãos da Justiça Federal e Estadual, ten­do o sentido de buscar o conhecimento direto da realidade e a constatação de problemas e, principalmente, de soluções. Como a Justiça Militar é um ramo da Justiça Brasileira, tam­bém lá a Corregedoria se fez presente. As conseqüências foram o aprimoramento do funcio­namento da Justiça Militar, em processo de diálogo com a administração do Tribunal, então presidido pelo  Cel. Brum, com melhoras signifi­cativas na transparência e no acesso do jurisdicionado, com a publicação na internet da jurisprudência do Tribunal e do acesso ao andamento dos processos. Quer dizer, respeitadas as parti­cularidades de sua competência, também a Justiça castrense deve estar inserida no amplo movimento de melhoria, transparência, celeridade e eficiência pelo qual vem passan­do o Poder Judiciário.

 

Direito Militar - Todos os Presidentes de Associações, em recente reunião do Conselho de Representantes, foram unânimes no reconhecimento do trabalho do CNJ, mas também houve algumas críticas alegando-se a interferência de Atos do CNJ que atingem diretamente a atividade Jurisdicional. Salientaram, em alguns casos, a forma de condução das audiências públicas que, embora sejam uma resposta à sociedade, tem permitido críticas à atuação de magistrados sem que os mesmos possam se defender, ainda que normalmente estejam presentes representantes de associações. Um documento com esta posição foi entregue ao Ministro Gilmar Mendes. Qual a sua apreciação sobre essas colocações?

Gilson Dipp - As audiências públicas realizadas por ocasião das inspeções foram os momentos de maior emoção em toda a minha longa atividade jurídica. Ver uma instituição, que era surda aos clamores das pessoas que dependem dos serviços que ela presta, abrin­do-se para ouvir, em viva voz, a opinião, o sentimento dos cidadãos, com seus reclamos e sugestões, dá a sensação de estar protagonizando evento histórico que no futuro será visto como um dos marcos da consolidação da demo­cracia brasileira.

Ouvir críticas, ácidas algumas vezes, incomoda, desgosta, mas é parte da condição de pessoa pública. Os excessos verbais ou de conteúdo foram coibidos e, ainda que tenham ocorrido aqui e acolá, há registro audiovisual que permite a apuração da responsabilidade civil e penal de seus autores.

Reafirmo o entendimento de que a audiên­cia pública é para ouvir, não para retrucar. Não há espaço para o contraditório. A resposta do Judiciário deve se dar com o contínuo aprimo­ramento da qualidade do serviço.

 

Direito Militar - A experiência de V. Excia à frente da Corregedoria do CNJ permite, cer­tamente, avaliar com mais precisão do que qualquer outro órgão, a real situação do Po­der Judiciário brasileiro. Qual a sua avaliação da Justiça brasileira?

Gilson Dipp - Serviço público essencial deve ser prestado com qualidade para que haja se­gurança jurídica e institucional suficientes para a pacificação social, condição primeira para o desenvolvimento econômico e social deseja­do pelos brasileiros. Por outro lado, ao prestar jurisdição com qualidade, o Judiciário se legiti­ma como protagonista do poder político, atu­ando de modo mais resoluto na balança de poderes, mantendo o equilíbrio das instituições.

 

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