Artigo - A Justiça Militar do Estado do Rio Grande do Sul: Uma reflexão histórica

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A Justiça Militar do Estado do Rio Grande do Sul: Uma reflexão histórica.


Sergio Antônio Berni de Brum1


O presente artigo pretende entregar aos leitores uma reflexão histórica sobre a Justiça Militar do Estado do Rio Grande do Sul (JMERS), desde a sua origem. Para tanto, imprescindível discorrer, mesmo que rapidamente, sobre fatos importantes da linha do tempo da história que refletiram na trajetória da JMERS.

Durante o artigo, elencaremos alguns marcos históricos na linha do tempo, que bem retratam a trajetória da JMERS.

Inicialmente, a fim de situar os leitores, destaco que a Justiça Militar, no Estado do Rio Grande do Sul, é mais antiga que a própria Justiça Comum. A Justiça Militar chegou ao Estado a bordo das naus portuguesas que integravam a expedição do Brigadeiro José da Silva Paes, que fundou, em 19 de fevereiro de 1737, a cidade de Rio Grande, no sul do estado, com o erguimento do “Forte Jesus, Maria, José” e do “Presídio de Rio Grande”, época em que vigiam regulamentos e leis militares aplicáveis à tropa armada.

Em 1808, forte no Alvará Régio de 1º de abril de 1808, Dom João VI criou o Conselho Supremo Militar e de Justiça, hoje o egrégio Superior Tribunal Militar.

Com a proclamação da independência do Brasil em 07 de setembro de 1822, inaugura-se o Período Regencial com o chamado “Primeiro Reinado”, que se encerra em 07 de abril de 1831 com a abdicação de Dom Pedro I em favor de seu filho Dom Pedro II, que tinha 5 anos de idade à época. Ou seja, o período intermediário entre o primeiro reinado e o segundo reinado vigorou por 9 anos, de 1831 até 1840 – com a declaração de maioridade de Dom Pedro II. Logo a seguir, em 18 de julho de 1841, temos a coroação de Dom Pedro II como Imperador do Brasil, que contava 15 anos de idade.

Apesar da importância e do destaque à época, a Constituição Política do Império do Brasil, de 25 de março de 18242, chamada Constituição de 1824, outorgada pelo Imperador Dom Pedro I - no Titulo 6º Capitulo único –Dos Juízes, e Tribunais de Justiça – Artigos 151 a 164 - nada fala sobre a Justiça Militar.

O período Regencial foi o meio legal, amparado na Constituição de 1824, para que Dom Pedro II pudesse governar o Brasil até que completasse 18 anos, idade mínima para ser coroado Imperador do Brasil. No entanto, a política de Estado do período regencial seguiu praticamente a mesma linha do primeiro reinado, pois vigia o autoritarismo do imperador e permanecia os constantes embates entre brasileiros e portugueses.

Nesse lapso temporal de nove anos o império do Brasil teve: a Regência Trina Provisória (1831), a Regência Trina Permanente (1831-1834), a Regência Una, do padre Diogo Antônio Feijó (1835-1837) e a Regência Una de Araújo Lima (1837-1840). Foi exatamente nesse período de forte instabilidade politica administrativa que brotaram várias revoltas: Ceára (1831/1832); Pernambuco (1831/1835); Minas Gerais (1833/1835); Grã Pará (1835/1840), Bahia (1837/1838); Maranhão (1838/1841).

Além das revoltas, temos o início de uma grande Revolução (Revolução Farroupilha) que ocorreu na Província de São Pedro do Rio Grande do Sul, antiga capitania de São Pedro do Rio Grande do Sul (a Revolução Farroupilha perdurou de 20 de setembro de 1835 a 1º de março de 1945, com a assinatura do tratado de paz, Tratado de Ponche Verde, na cidade de Dom Pedrito/RS, firmado pelo Duque de Caxias e os republicanos farroupilhas representados pelo General David Canabarro).

Nesta quadra histórica - Província de São Pedro governada pelo Marechal de Campo Antônio Elezéario de Miranda e Brito - nasceu a Brigada Militar do Estado do Rio Grande do Sul com sua primeira denominação – Corpo Policial – criado em 18 de novembro de 1837, através da Lei Provincial nº 7.

O Corpo Policial tinha um efetivo previsto de 19 oficiais e 344 praças e somente foi regulamentado em 5 de maio de 1841, não tendo registro em relação a Justiça Militar3. Para contextualizar, ressalto que as estimativas populacionais, coletadas de várias fontes de pesquisa, dão uma ideia do contingente demográfico até os meados do século XIX. No ano de 1832 era de 182.0004, e em 1846 era de 149.3635. Em relação ao período do conflito, entre 1835 e 1845, foram registrados 13.986 assentos no total, sendo 6.450 batizados e 7.536 de óbitos na Freguesia da Madre de Deus de Porto Alegre. Em 1872, ano do primeiro recenseamento geral da população brasileira, o Rio Grande do Sul possuía uma população estimada de 434.813 habitantes.

Destaco, e a historiografia demonstra, que o Corpo Policial veio suprir a extinção das Milícias e Ordenanças em razão da criação da Guarda Nacional – 18 de agosto de 1831 – mas também surgiu com a finalidade de auxiliar as “Justiças”, manter a boa ordem e a segurança pública na Capital e seus subúrbios, bem como nas comarcas por seus destacamentos.

Isto é, a Brigada Militar (Polícia Militar do RS) surgiu em plena Revolução Farroupilha, no chamado decênio heroico (1835/1845) e logo após, no ano de 1848, mais especificamente em 24 de julho, através da Lei 148, nascia a nossa Justiça Militar Estadual.

1º Marco: Faço questão de grifar essa data - 24/07/1848 - como um primeiro marco histórico na linha do tempo da JMERS.


A referência histórica desse nascimento encontramos no artigo 20 da Lei 148, in verbis:

“Artigo 20 – O Presidente da Província distribuirá a Força Policial de modo que julgar mais conveniente, e dirá a este corpo um regulamento organizado sobre as seguintes bases(..)

§9º deduzira da parte penal militar do exercito aqueles princípios que forem aplicáveis e indispensáveis para a manutenção da disciplina em geral e da subordinação em particular.”


Podemos então afirmar que a Justiça Militar do Estado do Rio Grande do Sul, desde a sua origem, tem por objetivo manter a disciplina, a hierarquia e principalmente a subordinação da Brigada Militar (Polícia Militar do RS). Mesmos objetivos se referem ao centenário Corpo de Bombeiros Militar do Estado, que foi recentemente organizado pela Lei Complementar nº 14.920, de 1º de agosto de 2016.

A Justiça Militar é garantidora de todos os direitos previstos na Constituição Federal, Constituição Estadual e nas leis extravagantes. A Justiça Militar assegura o comando às praças e aos oficiais dentro da Brigada Militar e do Corpo de Bombeiros Militar, que são os representantes do Estado em todas as suas regiões e rincões.

Voltemos, pois, ao ano de 1848 - quando da primeira referência da aplicação penal da legislação do Exército Nacional aos integrantes do recém-criado Corpo Policial/Brigada Militar - para resgatar que vigia à época o Código Criminal do Império do Brasil, de 16 de dezembro de 1830.

O artigo 308 do Código Criminal do Império assim disciplinava, in

verbis6:


Art. 308. Este Codigo não comprehende:



verbis:

(..)§ 2º Os crimes puramente militares, os quaes serão punidos na fórma das leis respectivas (228).

A nota de rodapé 228 constante do art. 308, por sua vez, dizia, in


O Aviso n. 300 de 9 de Outubro de 1955 manda que os conselhos de guerra punão os delitos militares com as penas civis, quando não as haja nos regulamentos militares nem nos artigos de guerra.

Reputão-se crimes meramente militares todos os declarados nas leis militares, e que só podem ser commettidos pelos cidadãos alistados nos corpos militares no exercito ou armada, como são:

1º Os que violão a santidade e a religiosa observância do juramento prestado pelos que assentão praça.

2º Os que ofendem a subordinação e boa disciplina do exercito ou armada.

3º Os que alterão a ordem, policia e economia do serviço em tempo de guerra ou paz.

4º O excesso ou abuso da autoridade em ocasião de serviço ou influencia de emprego militar, não exceptuados por lei, que positivamente prive o delinquente do fôro militar. Provisão de 20 de Outubro de 1934.

As leis militares que regulão em tempo de guerra são aplicáveis:

1º Áquella parte do exercito estacionada nas províncias que se achão, ou se houverem de achar em estado de rebelião.

2º Áquella parte do exercito que se tratar em províncias que forem invadidas por forças rebeldes.

3º Áquella parte do exercito que tiver ordem de marchar para algum dos pontos acima designados. Decreto de 24 de Outubro de 1838.

As agressões commettidas contra um presidente de província em artigos de jornaes por um oficial do exercito não constituem crime militar. Aviso de 26 de Abril de 1858. O facto de um ajudante de ordens da presidência vender animaes pertencentes ao Estado também não constitue crime militar, porque não é atribuição desse funcionário guardar animaes pertencentes ao Estado; é sim crime comum – Aviso nº 271 de 10 de Junho de 1869. È no fôro comum que deve ser julgado um soldado de artilharia, autor de ferimentos, de que proveio a morte de uma praça do corpo policial, visto que este caso não está compreendido na Provisão de 20 de Outubro de 1834. Aviso nº 406 de 14 de Setembro de 1865.


Em 29 de novembro de 1832 foi promulgado o Código de Processo Criminal e neste há referências sobre crimes propriamente militares.

Acerca do Código de Processo Criminal, Univaldo Correa (Juiz-Auditor aposentado de Santa Catarina) assim relata7:

“lembra ainda Romeiro que somente em 29 de novembro de 1832 com a promulgação do código de processo criminal, foram localizados nos artigos 8, 155, 171 e 324 os crimes puramente militares na clássica revisão: ratione personae e ratione materiae, a lei de 26 de maio de 1835 sobre deserção; a lei 201 de 1841 que no artigo 10 dispunha quando nas rebeliões ou sedições entrarem militares serão eles julgados pelas leis e tribunais militares; a resolução de 13 de outubro de 1858, a lei nº 562 de 1850, julgamento dos Conselhos de Guerra e a Lei nº 631 de setembro de 1851 (com nada menos de 16 dispositivos, nos oito parágrafos do seu artigo 1º, e diversos outros preceitos.”


Segue o douto Magistrado, Dr. Univaldo Correa: Ainda no império segundo o mesmo autor foram criados os Conselhos de disciplina, para verificar a deserção das praças de pré, os Conselhos de investigação para estudar atos criminais em que a deserção de Oficiais de patentes, os conselhos de guerra para julgar em primeira instância os crimes militares, o conselho Supremo Militar, Tribunal de Segunda Instância para julgamento dos referidos crimes, e as Juntas de Justiça Militar e os Conselhos para faltas disciplinares.”


Sigo no resgate da Legislação Penal Militar trazendo a luz o Código Penal da Armada (Decreto nº 18 de 07 de março de 1891); o Código Penal Militar8 de 24 de janeiro de 1944 (Decreto-Lei Nº 6.227 de 24 de Janeiro de 1944) e o atual Código Penal Militar de 21 de outubro de 1969 (Decreto-Lei Nº 1.002, de 21 de outubro de 1969).

Conforme Univaldo Correa9:


A parte processual foi inicialmente regulada pelo Supremo Tribunal Militar, em 16 de julho de 1895, face à autorização contida no artigo 5º, §1º, do Decreto Legislativo nº 149, de 18 de julho de 1893, para ser observado no Exército e Armada quatro meses após a sua publicação. Em 1920 esse Regulamento foi substituído pelo Decreto de 30 de outubro desse mesmo ano, e alterado, sucessivamente, pelos Decretos nºs 15.535, de 26 de agosto de 1922, 17.231-A, de 26 de fevereiro- e aqui aparecendo com o nome de Código de Justiça Militar e nº 24.803 de 14 de julho de 1934.

O Processo Militar foi novamente compilado quando o Decreto-lei nº 925, de 2 de dezembro de 1938, baixou o novo Código de Justiça Militar, que vigorou até a expedição dos Decreto-lei nº 1002 e 1003, ambos de 21 de outubro de 1969, o primeiro fazendo entrou em vigor o Código de Processo Penal Militar, e o segundo a lei da organização do Judiciário Militar, e os dois em vigor também a partir de 1º de janeiro de 1970.”


Após a publicação da Lei nº 148/1848, na Província de São Pedro do Rio Grande do Sul foi baixado o Regulamento de 10 de novembro de 1851, que previa em seu artigo 34: “As praças que desertarem, além da perda do tempo de serviço, decretada pelo artigo 9º da lei 195 de 23 de novembro de 1850, e as penas impostas na parte criminal perdem o direito a quantia que se lhes tiver descontado, na conformidade das disposições do capítulo 4º deste regulamento.”


À época, o único crime julgado no Corpo Policial era o crime de

Deserção.


Na Província de São Pedro do Rio Grande do Sul, hoje Estado do Rio Grande do Sul, em 23 de dezembro de 1857 foi assinado novo regulamento, com maior detalhamento. Pelo valor histórico à Justiça Militar, transcrevo o ensinamento do eminente magistrado e historiador Aldo Ladeira Ribeiro10:

“Art.4º - Fica criado sob o título de sessão de disciplina, uma seção de companhia, que será adida a 2º Companhia do 2º Esquadrão. Os Oficiais e Oficiais inferiores dessa seção serão escolhidos dentre os indivíduos que se tiverem distribuídos no atual Corpo Policial, pelos hábitos de disciplina e instrução militar.


Art. 5º Para esta seção teria passagem todas as praças do corpo policial, que forem designadas por decisão de um Conselho de Disciplina. As vagas, porém, que estas praças deixarem nas perspectivas Companhias não podem ser preenchidas.

A passagem de praças para a seção de disciplina constituía castigo e podia durar de um mês a um ano e durante este tempo ficavam inteiramente sujeitos as leis e regulamentos do Exército.

A mesma lei, em seu artigo 66, declarava que os oficiais e praças de pré estavam sujeitos a jurisdição dos tribunais ordinários, e do júri, pelos delitos ou crimes cometidos fora de suas funções ou no exercício delas, relativamente ao serviço de polícia administrativa e judiciária de que estivessem incumbidos, e aos Tribunais Militares pelos delitos ou crimes relativos ao serviço e disciplinar militar.


O artigo 67 dispunha que os oficiais e praças de pré seriam considerados no exercício de sua função sempre que estivessem fardados.”


“E o artigo 68 rezava:


Serão reputados crimes ou delitos: 1º) Deserção; 2º) A revolta ou falta de subordinação; 3º) O abandono de posto ou de serviço; 4º ) A violência contra superior, ou qualquer outra autoridade, contra quaisquer individuo, ou praça, dentro do aquartelamento, ou no desempenho de suas funções; 5º) O descaminho ou apropriação de quaisquer objetos, que estiverem a seu cargo, pertencentes a Fazenda Pública ou a particulares; 6º) A falta de cumprimento de ordem superiores tendentes a segurança e tranquilidade pública, na prisão ou captura de criminosos; 7º) O excesso ou abuso de autoridade; 8º) a desobediência às autoridades constituídas, sob cuja direção ou inspeção estiverem na forma das ordens superiores, e das leis e regulamentos respectivos; 9º) A prevaricação; 10º) A Peita; 11º) O Suborno; 12º) A irregularidade de conduta; 13º) A falsidade; 14º) O peculato; 15º) O contrabando; 16º) A fuga do preso; 17º) A ameaça contra superior, ou qualquer autoridade; 18º) A injuria ou calunia contra o superior, ou outra qualquer autoridade; 19º) O dano causado no desempenho de qualquer comissão; 20º) A ofensa à moral pública, a religião e bons costumes; 21º) A embriaguez habitual; 22º) A frequência em taberna e casa de jogos proibidos; 23º) O uso ou emprego em qualquer negócio, ou ramo de comércio.”

O artigo 69 do novo Regulamento (1857) previa que os crimes de deserção e a insubordinação eram classificados e definidos conforme as leis militares do Império. O artigo 90 do Regulamento disciplinava, in verbis:

“O excesso e abuso de poder, a prevaricação e desobediência, o suborno, a irregularidade de conduta, a falsidade, o peculato, o contrabando, a ameaça, a injúria, e a calúnia, serão classificadas e definidas segundo as disposições do Código Penal.”


O mesmo regulamento criava o Conselho de Disciplina, formado por um Presidente e dois vogais nomeados pelo Presidente da Província dentre os Oficiais de primeira linha da Polícia ou da Guarda Nacional. Interessante que a forma do processo seria o instituído para a Guarda Nacional pela Lei Geral nº 602 de 19 de setembro de 1830, com a seguinte alteração: que ao Juiz relator compete por fim aos debates, fazer o resumo de todas as alegações e provas, e propor os quesitos que trata o artigo 189 da mesma lei.

Fica cristalino que a “Justiça” nesse período ficava a serviço do Presidente da Província, que nomeava livremente os membros do Conselho e da Junta Superior.

O regulamento de 1857 previa, ainda, que o órgão revisor, denominado de Junta, era formado por um juiz criminal e dois oficiais, sendo presidido pelo Presidente da Província.

Agrego aqui uma vírgula e faço uma reflexão histórica. Atualmente a nação brasileira esta passando por momento de transformações, notadamente com o combate aos crimes contra a administração pública, como o crime de corrupção. O delito de corrupção, na quadra da criação da Justiça Militar Gaúcha, não era previsto nos regulamentos. No entanto, existia a previsão legal dos crimes de Peita e o Suborno, tipificados no Regulamento de 1857 e no Código Criminal do Império, de 16 de dezembro de 1830.

Crime de Peita:


“(..) artigo 130 – receber dinheiro, ou outro algum donativo, ou aceitar promessa direta, e indiretamente para praticar, ou deixar de praticar acto de officio contra, ou segundo a lei.(...)”

Suborno:


“Artigo 133 – deixar-se corromper por influencia, ou peditório de alguém, para obrar o que não dever, ou deixar de obrar o que dever.”


Já em 19 de janeiro de 1859, novo regulamento foi baixado e as disposições de regulamento de 1857 foram alteradas. Destaco:

O acusado, em caso de recurso poderia oferecer, por escrito, novas razões que sustentassem sua defesa, para que o Juiz relator, logo que lhe fosse presente o processo, marca-lhe-ria o prazo peremptório de oito dias.”

Em 31 de dezembro de 1869 foi baixado novo Regulamento mantendo as mesmas normas anteriores, mas dando destaque às penalidades aplicadas para o crime de Deserção aos integrantes do Corpo Policial.

Em 03 de fevereiro de 1874 foi instalado em Porto Alegre o Tribunal da Relação, hoje Tribunal de Justiça/RS (no ano de 2024 completa 150 anos de história), sendo seu primeiro Presidente o Conselheiro João Baptista Gonçalves Campos.

Em Ato de 28 de outubro de 1876 as Juntas de Justiça foram extintas, passando o julgamento dos processos do Conselho de Disciplina a serem feitos unicamente pelo Presidente da Província, revisor das Decisões de primeiro grau.

O Paradigmático Coronel e Magistrado Aldo Ladeira Ribeiro assim se manifesta sobre o ato acima mencionado:

Ato de 28 de outubro de 1876. Alternando disposições, do Título XV do Regulamento de 24 de dezembro de 1873. O Presidente da Província, considerando a inconveniência do disposto no Título XV do Regulamento de 24 de dezembro de 1873, que impõe deveres e obrigações a funcionários e autoridades adstritas por lei geral ao cumprimento de outros deveres, de forma que jamais poderão ser coagidos a executar o que no dito regulamento se estabelece, ficando deste modo o governo da Província em posição dependente da vontade dos citados funcionários, com prejuízo do serviço e da pronta administração da Justiça, considerando mais que não foi ainda o dito Regulamento aprovado pela Assembleia Provincial, a cujo

conhecimento deverá ser submetido, nos termos do artigo 26 da Lei de 26 de abril de 1873 e usando da faculdade do artigo 4º, da Lei de 12 de agosto de 1834, resolve alterar as disposições do Titulo XV do citado Regulamento, que ficam substituídas pelos seguintes:

Art. 1º - As faltas contra a disciplina de que trata o artigo 92 deste Regulamento, serão julgadas por meio de uma Comissão Disciplinar, ouvindo-se testemunhas do fato e à vista de documentos, nos quais se compreende a justificação por escrito do acusado.

§ 1º - A Comissão Disciplinar se comporá de um Presidente e dois membros.

§ 2º - Se o culpado for Oficial servirá de presidente um capitão e de membros dois oficiais de patente igual à do acusado, designados pelo presidente da Província.

§ 3º - Se for praça de pré o presidente será tenente e os membros alferes nomeados pelo comandante-geral.

Art. 2º - À vista das provas de culpa, a Comissão indicará as pessoas marcadas neste Regulamento, em que julgar incurso o acusado, tendo em atenção as circunstâncias agravantes e atenuantes nele designadas.

Art. 3º - Os pareceres da Comissão serão tomados por maioria absoluta de votos.

Art. 4º - Emitido o parecer pela Comissão, será o processo remetido pelo comandante-geral e com informação deste, ao Presidente da Província, que resolverá definitivamente sobre a pena que deva ser cumprida pelo acusado.

Art. 5º - Quando dos papéis sujeitos ao conhecimento do presidente da Província se verificar a existência de algum crime comum ou de responsabilidade, o mesmo presidente mandará extrair dos autos cópia das peças que disserem respeito aos ditos crimes e as enviará à autoridade competente para proceder como for de direito, sem prejuízo das penas disciplinares em que incorrer o acusado.

Art. 6º - Qualquer réu que tiver de responder por faltas que contra a disciplina e serviço da Força Policial cometer, será imediatamente remetido para a capital, onde sempre funcionará a Comissão Disciplinar.

Art. 7º - Segundo a gravidade da culpa, o presidente da Província ordenará a prisão do acusado ou lhe concederá o quartel ou a cidade por menagem.

Art. 8º - Os comandantes de seções, quando seus subordinados cometerem culpas pelas quais deverão ser punidos com as penas

marcadas neste Regulamento, exigirão das autoridades policiais que tomem os depoimentos das testemunhas dos fatos, os quais serão enviados ao comandante-geral para serem presentes à Comissão que for nomeada.

Art. 9º - No processo escreverá o membro da Comissão menos graduado ou mais moderno, quando necessário sejam termos escritos.

Palácio do Governo, em Porto Alegre, 28 de outubro de 1876. Tristão de Alencar Araripe.”11


Com a proclamação da República, em 15 de novembro de 1889, surgiu a necessidade de assegurar a disciplina da Guarda Cívica e em Ato de 28 de março de 1892 a Guarda Cívica, de duração efêmera, passou a ser chamada Corpo Policial do Estado.

A Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, promulgada pelo Congresso em 24 de fevereiro de 1891, normatiza o Poder Judiciário (Seção III, artigo 55 a 62, regulando nos artigos 61 e 62 a Justiça Estadual). Contudo, a novel Constituição não refere a Justiça Militar da União e Estadual.

O destacado Magistrado e historiador Juiz Militar Aldo Ladeira Ribeiro discorre:12 A Constituição Federal de 1891 silenciou completamente sobre as forças Estaduais. Assim, sem existência assegurada pela lei magna, eram elas apenas toleradas, como remanescentes das Corporações que haviam existido no Regime Monárquico. No obstante, a Brigada Militar foi utilizada pelo Governo Federal, para auxiliar na manutenção da ordem, durante a Revolução Federalista, de 1893 a 1895. Foi, mesmo, sobre ela e sobre os Corpos Provisórios, então organizados, que recaiu todo o peso das operações.”

No ano de 1892, logo após a Proclamação da República, forte na instabilidade política do Estado, a Guarda Cívica foi convertida no Corpo Policial, como uma medida tendente a assegurar a disciplina da tropa. Em seguida, sucessivas alterações dispositivas culminaram com a instituição de um Conselho de Disciplina para julgar os oficiais.

“Dispôs-se, então, que os oficiais do Corpo Policial seriam julgados por um Conselho Disciplinar, que se constituiria de um auditor, nomeado pelo governador, e para o qual poderiam ser chamados a servir, por nomeação desta autoridade, e conforme a natureza dos casos, oficiais da Guarda Nacional ou Reformado do Exército, precedendo, quanto a estes a necessária autorização do poder competente.13

Em 13 de maio de 1892, o Governo do Estado (Junta governativa gaúcha, de 12 de novembro de 1891 a 12 de junho de 1892, formada por: Joaquim Francisco de Assis Brasil; João de Barros Cassal; Domingos Alves Barreto Leite; Manoel Luiz da Rocha Osorio) abriu processo disciplinar contra um grupo de oficiais que reagiram fortemente às alterações das normativas e contra as autoridades constituídas à época. Ao final, os oficiais foram expulsos da corporação e recolhidos à “Casa de Correção”. Neste processo atuou como auditor de guerra, o Dr. Severo Peixoto de Oliveira Barcellos, sendo, assim, considerado o primeiro Magistrado da Justiça Militar do Estado14.

Pelo Ato nº 357, do Presidente do Estado, Dr. Fernando Abbott, em 15 de outubro de 1892, a Guarda Cívica, denominação que o antigo Corpo Policial recebera logo após a Proclamação da República, foi transformada em Brigada Militar.

Em 1893, o Governo baixou o Regulamento Disciplinar e Processual, inspirado, ainda, no Código da Armada, que instituiu o Conselho de Julgadores na primeira instância, reservando o grau recursal para o Presidente do Estado. O Ato nº 12-A, de 24 de janeiro de 1893, instituiu o Tribunal de Justiça como instância recursal das decisões do Conselho.

Em 28 de janeiro de 1911 foi aprovado o Regulamento Penal para a Brigada Militar – Decreto nº 1697 – no Governo de Carlos Barbosa Gonçalves (1908 a 1913).

Enfatizo que desde a primeira referência da Justiça Militar, de 1848 até 1918 com a criação do Conselho Militar (1º Grau) e do Conselho de Apelação (2º Grau), o Presidente da Província designava caso a caso a composição dos julgadores.

No inicio do ano de 1917, a bancada Gaúcha na Câmara Federal apresentou um projeto dando competência aos Conselhos de Guerra, constituídos nas Forças Estaduais, para julgarem os Oficiais e Praças das mesmas Corporações nos crimes propriamente militares, abrindo caminho para a Lei Federal nº 3.351, de 3 de outubro de 1917, que autorizou os julgamentos.

Em consequência, o Decreto nº 2.347-A, de 28 de maio de 1918 (Regulamento disciplinar e processual para a Brigada Militar), estabeleceu os Conselhos de Disciplina, organizados extraordinariamente em um Conselho Militar permanente para o primeiro grau e, como instância revisora, o Conselho de Apelação (o Conselho de Apelação da BM iniciou os trabalhos em 19 de junho de 1918, quando da assinatura da Primeira ata).

Aqui está a origem do Tribunal de Justiça Militar. Governava o Estado Gaúcho o Dr. Antônio Augusto Borges de Medeiros.

O artigo nº 61, 62 e 72 do Decreto nº 2347-A, previa:


“TITULO II Organisação judiciaria militar CAPITULO I

Art. 61.º - A justiça militar será administrada:

  1. por um conselho militar;

  2. por um conselho de apelação. CAPITULO II

Do Conselho militar, sua composição e competência

Art 62.º - O conselho militar, que tiver de julgar officiaes, será compósto de um official superior, como presidente, do auditor, relator como voto, e de três officiaes com patente superior, ou pelo menos igual à do accusado, sempre que fôr possivel.

§ único – Em caso algum fará parte do conselho official do corpo a que pertence o acusado, salvo quando este fôr praça pret

Art 63.º - O conselho militar que tiver de julgar praças de pret. será composto de um official superior, como presidente, de um capitão, como interrogante, do auditor e de dois officiaes subalternos.

CAPITULO III

Do Conselho de Appellação, sua composição e competencia

Art. 72.º - O conselho de appelação se comporá de cinco membros, um dos quaes será o commandante da Brigada, ao qual compete a presidencia do mesmo conselho.

Os outros tres membros militares serão convocados pelo commandante da Brigada, dentre os commandantes de corpos mais antigos, e o quinto, togado, será livremente nomeado pelo presidente do Estado, dentre os magistrados estaduaes ou profissionaes competentes, para servir habitualmente, emquanto assim conviér.”


A história deixou registrado que a primeira composição do Conselho de Apelação da Brigada Militar, em 1918, foi assim constituída, conforme registros no Livro de Atas de 19 de junho de 1918: Coronel Afonso Emilio Massot, Comandante-Geral da Brigada Militar e Presidente do Conselho de Apelação; Claudino Nunes Pereira, Coronel-Juiz; Leopoldo Ayres de Vasconcellos, Coronel-Juiz; Câmara e Sá, Coronel-Juiz e Francisco de Souza Ribeiro Dantas, Juiz-togado, relator dos processos por força da lei.

2º Marco: Avalio o Conselho de Apelação da Brigada Militar como um segundo marco histórico na linha do tempo da JMERS.


A Lei Federal nº 4.527/1922 estabeleceu que os Oficiais e Praças das Polícias Militarizadas dos Estados teriam foro especial, quando autores de crimes previstos no Código Penal Militar, conforme previa o artigo 77 da Constituição Federal de 1891: “Os militares de terra e mar terão foro especial nos delitos militares”

Diante dessa lei, o governo gaúcho baixou o Decreto nº 2.949 de 16 de março de 1922:

“O Conselho Militar, instituído pelo Decreto nº 2347-A, de 28 de maio de 1918, é competente para processar e julgar os Oficiais e Praças

da Brigada Militar, por qualquer dos crimes previstos no Código Penal Militar com Apelação necessária para o Conselho de Apelação, também instituído no referido Decreto.”


Avançando no tema, o Decreto nº 3.249, de 13 de março de 1924, criou o cargo de Juiz-Auditor civil, de livre nomeação do Presidente do Estado, para funcionar no primeiro grau junto ao Conselho Militar.

A Lei Federal nº 192, de 17 de janeiro de 1936, reorganizou as policias militares dos Estados, concentrando-as na manutenção da segurança pública, esvaziando as competências militares e considerando-as reservas do Exército Nacional. A Lei determinou que cada Estado organizasse a sua Justiça Militar, o que foi executado apenas por São Paulo (1937) e Minas Gerais (1946) – o Rio Grande do Sul já possuía seu Conselho de Apelação desde 1918.

Adiciono, ainda, que o texto constitucional de 1934 previu que os Estados Membros da União não poderiam mais normatizar e baixar atos ou Decretos sobre o Direito Penal e Processual Penal, prática usual no início da Justiça Militar Estadual, como até aqui verificamos. A Constituição de 1934 previa no seu “artigo 5º:

Compete privativamente a União (..)


XIX – legislar sobre


  1. Direito Penal, Comercial, Civil e Processual, Registros Públicos e Juntas Comerciais.


A Justiça Militar da União foi inserida no texto constitucional pela primeira vez pela Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, de 16 de julho de 1934:

“Capitulo IV – Do Poder Judiciário


Seção V – Da Justiça Militar artigos 84 a 87.”


Em 22/12/1936 foi designado pelo Governador do Estado, Dr. José Antônio Flores da Cunha, o primeiro Procurador de Justiça para desempenhar suas funções junto ao Conselho de Apelação, o Dr. Othelo Frota.

A Constituição dos Estados Unidos do Brasil, de 10 de novembro de 1937, manteve a Justiça Militar da União nos seus artigos 111 a 113.

O Decreto-lei nº 47/1940, por iniciativa da Interventoria Federal15, fixou a Lei Orgânica da Justiça Militar do Estado, convertendo o Conselho de Apelação em Corte de Apelação e, finalmente, atribuindo aos seus membros garantias de magistrados, o que limitou as interferências do Comando-Geral da Brigada nos julgamentos.

3º Marco: Atribuo a conversão do Conselho de Apelação em Corte de Apelação, como o terceiro marco histórico na linha do tempo da JMERS.


No primeiro grau, foram instituídos dois Conselhos: o Especial, para julgar oficiais, e o Permanente, para julgar as praças. Junto aos Conselhos funcionava um Juiz-Auditor e o Ministério Público.

A primeira composição do Pleno da Corte de Apelação, em 02 de janeiro de 1941: Coronel Antero Marcelino da Silva Junior, Juiz-Militar e Presidente da Corte; Coronel Alzemiro Francisco Wellausen, Juiz-Militar; Coronel Aristides Krauser do Canto, Juiz-Militar; Coronel Aldo Ladeira Ribeiro, Juiz-Militar e Dr. Alarico Cabeda, Juiz-Civil. Atuava como representante do Ministério Público o Dr. Gastão Bernd, Procurador de Justiça.

Em 3 de janeiro de 1941, o Governador do Estado, General Osvaldo Cordeiro de Farias, nomeou o advogado da Justiça Militar, o Dr. Amado da Fonseca Fagundes16, no Posto de Capitão, forte no Artigo 51 do Decreto-Lei nº 47/1940.

Logo a seguir o Decreto-Lei nº 559, de 2 de junho de 1944, criou o Conselho de Justiça para julgar as deserções, e reorganizou a Justiça Militar, revogando o Decreto-Lei nº 47 de 19 de novembro de 1940.

A Constituição dos Estados Unidos do Brasil, de 18 de setembro de 1946, disciplinou a Justiça Militar da seguinte forma:

Capitulo IV, do Poder Judiciário, Seção IV, dos Juízes e Tribunais Militares, nos artigos 106 a 108, manteve a Justiça Militar da União;

no Título II – Da Justiça dos Estados; artigo 124, XII – A Justiça Militar Estadual, organizada com observância dos preceitos gerais da lei federal (artigo 5º, XV, letra “f”, terá como órgãos de primeira instância os Conselhos de Justiça e como órgão de segunda instância um Tribunal Especial ou Tribunal de Justiça.


4º Marco: Pela inclusão da Justiça Militar Estadual no capítulo do Poder Judiciário, tenho a Constituição Federal de 1946 como o quarto marco histórico na linha do tempo da JMERS.


A Lei nº 3.350, de 27 de dezembro de 1957 criou a Segunda Auditoria, em Santa Maria, descentralizando-a da capital do Estado.

O Ato Institucional nº 2, de 27 de outubro de 1965, ampliou a competência da Justiça Militar Federal para processar e julgar civis autores de crimes contra a segurança nacional, cabendo recurso das decisões de primeiro grau ao Superior Tribunal Militar e ao Supremo Tribunal Federal.

A Lei nº 5.394, de 27 de dezembro de 1966 – unifica a jurisdição das Auditorias da Justiça Militar do Estado e dá outras providências.

O Presidente da República baixou o Decreto-Lei nº 317 de 13 de março de 1967, o qual reorganiza as Policias e os Corpos de Bombeiros Militares dos Estados, dos Territórios e do Distrito Federal e dá outras providências, revogando a Lei nº 192 de 17 de janeiro de 1936. Esse Decreto-Lei no seu Capitulo V – dispõe sobre a justiça e disciplina e restabelece o Foro Militar para o processo e julgamento dos Servidores das Policias Militares nos crimes definidos em lei como militares.

A Justiça Militar da União e dos Estados, igualmente encontra previsão na Constituição da República Federativa do Brasil de 1967.

Justiça Militar da União (Capitulo VIII – Do Poder Judiciário, Seção V dos Tribunais e Juízes Militares, artigos 120 a 122) e a Justiça Militar

Estadual (Capitulo VIII – Do Poder Judiciário, Seção VIII – Da Justiça dos Estados, artigo 136, §1, “d”).


A Constituição Estadual de 14 de maio de 1967 estabeleceu a transferência da jurisdição de segundo grau (Corte de Apelação) para o Tribunal de Justiça.

O Governo Estadual (Governava o Estado Dr. Walter Perachi Barcelos – 1966/1971), contrário a essa alteração, arguiu junto ao Superior Tribunal Federal a inconstitucionalidade de 54 artigos, dentre os quais o que extinguia a Corte de Apelação. A transferência não chegou a ser implementada, pois a Constituição Federal de 17 de outubro de 1969 esvaziou a discussão sobre a constitucionalidade da carta gaúcha, determinando aos Estados que votassem novas constituições e quanto a Justiça Militar dos Estados limitou-se à primeira instância excetuando aqueles Estados que houvessem instalados Cortes Recursais antes de 15 de março de 1967 (Rio Grande do Sul, São Paulo e Minas Gerais).

(Capitulo VIII – do Poder Judiciário, Seção VIII Dos Tribunais e Juízes Estaduais, IV, §3º, “d”. Disposições Gerais e Transitórias (..) artigo

192 – São mantidos como órgão de segunda instância da Justiça Militar Estadual os Tribunais especiais criados, para o exercício dessas funções antes de 15 de março de 1967.)


Nesse resgate, vale referir que o Ato Institucional nº 5 (AI-5), de 13 de dezembro de 1968, suspendeu definitivamente a garantia constitucional do Habeas Corpus nos crimes políticos contra a segurança nacional, a ordem politica e social e a economia popular. O AI-6, de 1º de fevereiro de 1969, suprimiu o recurso ordinário ao Supremo Tribunal de decisões proferidas pela Justiça Militar contra civis.

Já em 1969, o Presidente da República editou o Decreto-Lei nº 667 de 03 de junho de 1969 – Reorganizando as Policias Militares e os Corpos de Bombeiros dos Estados, mantendo o mesmo regramento para o julgamento dos policiais militares e bombeiros militares posto no Decreto-Lei nº 317, que foi revogado.

Em 21 de outubro de 1969, os Ministros da Marinha de Guerra, do Exército e da Aeronáutica Militar, decretam o Código Penal Militar e o Código de Processo Penal Militar, Decreto-lei nº 1.001 e Decreto-lei nº 1.002, respectivamente, revogando o obsoleto Código Penal Militar, de 24 de janeiro de 1944, que não tinha muitas inovações contemporâneas do Direito Penal.

A Lei nº 6156 de 31 de dezembro de 1970, aprovada pela Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul e sancionada pelo Governador do Estado, Coronel Walter Perachi de Barcellos, foi um marco histórico importantíssimo para a Justiça Militar Estadual, pois disciplinava a Organização Judiciária Militar revogando a legislação anterior. Esta lei manteve as duas Auditorias (Porto Alegre e Santa Maria), os Conselhos Permanentes, Especial e de Justificação e a Corte de Apelação com a composição de cinco membros – dos quais um civil – nomeado pelo Governador.

A Lei Ordinária nº 6.968, de 31 de dezembro de 1975, criou a 3ª Auditoria Militar na cidade de Passo Fundo.

Em 17 de dezembro de 1979 foi editada a Lei nº 7.315, que dispõe sobre o Quadro de Pessoal dos Serviços Auxiliares da Justiça Militar do Estado, sendo alterada pela Lei 7.487/1981, com nova alteração através da Lei nº 8.763/1988.

Faço um corte na cronologia legislativa para realçar que recentemente a JMERS foi modernizada pela Lei nº 15.945/2023, que dispõe sobre a unificação dos quadros de pessoal dos servidores efetivos, dos cargos em comissão e das funções gratificadas do Poder Judiciário – Justiça Militar do Estado – e a instituição do Plano de Carreiras, Cargos, Funções e Remunerações dos Servidores do Poder Judiciário – Justiça Militar do Estado.

Voltando à memória legal, destaco que em 1º de fevereiro de 1980, o Código de Organização Judiciária do Estado (COJE), Lei nº 7.356/1980, fixou a composição do Tribunal Militar do Estado em sete juízes, quatro militares e três civis, todos nomeados pelo Governador e a Lei nº 7.706/82 determinou que, obrigatoriamente, um dos juízes civis fosse escolhido dentre os Juízes-Auditores.

5º Marco: O COJE e a fixação do Tribunal Militar do Estado, classifico como o quinto marco histórico na linha do tempo da JMERS.


No Código de Organização Judiciária do Estado (Lei nº 7.356, de 1º de fevereiro de 1980), temos a previsão legal dos órgãos da Justiça Militar .

“DOS ÓRGÃOS JUDICIÁRIOS

Art. 231 - São órgãos da Justiça Militar do Estado:

  1. - O Tribunal Militar;

  2. - Os Juízes Auditores;

  3. - Os Juízes Auditores Substitutos;

  4. - Os Conselhos de Justiça.”


    Em que pese o comando legal previsto na Lei nº 7.356/1980 (COJE), alterando a composição da Corte de Apelação de 5 (cinco) para 7 (sete) julgadores, só em 1984 esta transformação ocorreu plenamente, conforme se vê na Ata nº 1.754 de 16 de dezembro de 1983 quando foi eleita a nova administração para o biênio 1984/1985 que assim ficou constituída: Presidente: Juiz-Civil Antonio Fornari; Vice-Presidente/Corregedor, Juiz-civil Rubem Scheid; Juiz-Militar Odilon Camargo; Juiz-Militar Assis Fontoura de Almeida; Juiz-Militar Antônio Claudio Barcellos Abreu; Juiz-Militar Luís Diogenes Chaves Couto, Juiz-Civil José Luiz Vieira. Atuava na corte o Dr. Alfredo Nascimento Barbosa, Procurador de Justiça classificado na 25º Procuradoria da Corte de Apelação.

    Em 29 de setembro de 1981, no governo do Dr. José Augusto Amaral de Souza, foi inaugurado o prédio atual do Tribunal de Justiça Militar do Estado do Rio Grande do Sul, deixando, assim, de ocupar as dependências do Quartel do Comando-Geral da Brigada Militar.

    No ano de 1982 foi criada a 4ª Auditoria Militar, com sede em Porto Alegre. Lei Estadual nº 7.706/82, de 15 de outubro de 1982, art. 230, § 1º17.

     

    6º Marco: Avançando no tempo, temos a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, que identifico como o sexto marco histórico na linha do tempo da JMERS.


    Isso porque durante a Assembleia Nacional Constituinte surgiram propostas de extinção das Justiças Militares (União e Estadual), impondo-se, por conseguinte, fortes debates sobre a justiça castrense.

    Na ocasião, movimentos políticos comprovaram que os tribunais militares nos Estados consumiam parcela muito pequena do orçamento judiciário (no RS, menos de 1%) e prestavam um relevante serviço, porquanto julgavam os crimes militares com mais propriedade, rigor e celeridade do que normalmente faria a Justiça Comum. Ou seja, comprovaram que a manutenção da Justiça Militar constituía uma garantia ao cidadão e à democracia.

    Após as vibrantes discussões, a Constituição Federal de 1988 manteve o Tribunal de Justiça Militar naqueles Estados onde o contingente militar fosse superior a 20 mil integrantes, como também ampliou-lhe a competência, restabelecendo a possibilidade de processar e julgar os policiais militares e os bombeiros militares nos crimes militares definidos em lei, além de decidir sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças. A Emenda Constitucional nº 18, de 5 de fevereiro de 1998, explicitou a condição militar dos membros das policias militares e dos corpos de bombeiros militares.

    No âmbito Estadual, citamos a Constituição do Estado do Rio Grande do Sul, de 03 de outubro de 1989, que regulamenta a Justiça Militar Estadual no Capítulo III – Do Poder Judiciário, Seção I, artigo 91 e na Seção V, artigos 104 a 106.

    “(...)Seção I Disposições Gerais

    Art. 91. São órgãos do Poder Judiciário do Estado:

    1. - o Tribunal de Justiça;

    2. - o Tribunal Militar do Estado;

    3. - os Juízes de Direito;

    4. - os Tribunais do Júri;

    5. - os Conselhos de Justiça Militar;

    6. - os Juizados Especiais e de Pequenas Causas;

    7. - os Juízes Togados com Jurisdição limitada.

Parágrafo único. Os Tribunais de segunda instância têm sede na Capital do Estado e jurisdição em todo o território estadual.


(...)Seção V

Da Justiça Militar

Art. 104. A Justiça Militar, organizada com observância dos preceitos da Constituição Federal, terá como órgãos de primeiro grau os Conselhos de Justiça e como órgão de segundo grau o Tribunal Militar do Estado.

§ 2.º -º A escolha dos Juízes militares será feita dentre coronéis da ativa pertencentes ao Quadro de Oficiais da Brigada Militar ou do Corpo de Bombeiros Militar.

§ 4.º A estrutura dos órgãos da Justiça Militar, as atribuições de seus membros e a carreira de Juiz-Auditor serão estabelecidas na Lei de Organização Judiciária, de iniciativa do Tribunal de Justiça.

§ 5.º Os Juízes do Tribunal Militar do Estado terão vencimento, vantagens, direitos, garantias, prerrogativas e impedimentos iguais aos Desembargadores do Tribunal de Justiça.

Art. 105. Compete à Justiça Militar Estadual processar e julgar os servidores militares estaduais nos crimes militares definidos em lei.

Art. 106. Compete ao Tribunal Militar do Estado, além das matérias definidas nesta Constituição, julgar os recursos dos Conselhos de Justiça Militar e ainda:

  1. - prover, na forma da lei, por ato do Presidente, os cargos de Juiz-Auditor e os dos servidores vinculados à Justiça Militar;

  2. - decidir sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças, na forma da lei;

  3. - exercer outras atribuições definidas em lei.”


No ano de 1994 a justiça militar gaúcha inicia sua caminhada à justiça 100% digital com a criação do sistema informatizado da Justiça Militar do Estado (SIJME), que em 2009 foi substituído pelo Sistema Eletrônico de Gerência Administrativa (SEGA). No ano de 2014 foi implantado o SEI –Sistema Eletrônico de Informações. No ano de 2015 foi implantado nos processos judiciais na esfera cível o PJE – Processo Judicial Eletrônico e em 2018 implantou-se o SEI Julgar (para julgamento dos processos administrativos) e o Sistema E-Proc. Mais recentemente, em 2020, foi

implantado, por meio do Provimento nº 02/2020-CGJME, o PJeCor (sistema informatizado desenvolvido pelo CNJ especificamente para as corregedorias) e o SEEU (Sistema Eletrônico de Execução Unificado do CNJ), forte do Provimento nº 045/2020-CGJME.

Avançando na trajetória da JME, cumpre fazer breve comentário sobre a Emenda Constitucional nº 45, de 30 de dezembro de 2004, que alterou dispositivos constitucionais, instituindo a chamada reforma do Judiciário, com diversas mudanças na organização e funcionamento dos tribunais.

No que tange à JME, saliento dois pontos significativos: (i) ampliação da competência (competência cível nas ações judiciais contra atos disciplinares) e (ii) denominação, pois o Tribunal Militar do Estado passou a ser denominado Tribunal de Justiça Militar.

7º Marco: Considero a Emenda Constitucional nº 45 o sétimo marco histórico na linha do tempo da JME.


A Emenda Constitucional nº 45/2004 inclui no texto constitucional o

§ 3º do art. 125, que disciplina que a lei estadual poderá criar, mediante proposta do Tribunal de Justiça, a Justiça Militar estadual, constituída, em primeiro grau, pelos juízes de direito e pelos Conselhos de Justiça e, em segundo grau, pelo próprio Tribunal de Justiça, ou por Tribunal de Justiça Militar nos Estados em que o efetivo militar seja superior a vinte mil integrantes.

Pela importância quanto à ampliação da competência da Justiça Militar Estadual, transcrevo os seguintes dispositivos constitucionais:

Art. 125. Os Estados organizarão sua Justiça, observados os princípios estabelecidos nesta Constituição.


(...)


§ 4º Compete à Justiça Militar estadual processar e julgar os militares dos Estados, nos crimes militares definidos em lei e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, ressalvada a competência do júri quando a vítima for civil, cabendo ao tribunal competente decidir

sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças (§ 4º do art. 125).


§ 5º Compete aos juízes de direito do juízo militar processar e julgar, singularmente, os crimes militares cometidos contra civis e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, cabendo ao Conselho de Justiça, sob a presidência de juiz de direito, processar e julgar os demais crimes militares.


Seguindo a cronologia legislativa, cumpre referir a publicação da Lei nº 13.491, de 13 de outubro de 2017, que alterou o Decreto-Lei nº 1.001 –Código Penal Militar (CPM) – ampliando a competência da Justiça Militar Estadual. Referido dispositivo legal deu nova redação ao art. 9º do Código Penal Militar disciplinando que se considera crimes militares em tempo de paz os crimes previstos no Código Penal Militar e os previstos na legislação penal, quando praticados nas hipóteses previstas nas suas alíneas. Ou seja, a alteração legislativa aumentou a competência da justiça militar à legislação penal comum. A título exemplificativo podemos citar os crime de abuso de autoridade e tortura praticados contra civis.

Encerrando - para um entendimento didático da história da nossa justiça castrense - registro que a Justiça Militar do Estado do Rio Grande do Sul desde a sua criação (ano de 1848) até a Constituição Federal de 1846, quando passou a integrar o Poder Judiciário, foi uma justiça ligada ao Poder Executivo. Em alguns períodos esteve vinculada diretamente ao Presidente da Província/Governador do Estado e ao Comandante-Geral da Brigada Militar.

Pela pertinência, vale aludir que em vários países a Justiça Militar se trata de um órgão do Poder Executivo e não do Poder Judiciário. No entanto, a Justiça Militar Brasileira floresce como exemplo a ser seguido, pois como órgão do Poder Judiciário mantém vivo o controle da disciplina, hierarquia e subordinação, princípios tão caros aos seus jurisdicionados, no caso do JMERS - integrantes da Brigada Militar com seus 185 anos e do centenário Corpo de Bombeiros Militar do Estado, que foi recentemente organizado pela Lei Complementar nº 14.920, de 1º de agosto de 2016.

Prezados leitores, encaminhando para o final deste artigo, assinalo que o principio da duração razoável do processo, previsto na Constituição

Federal, no seu artigo 5º, inciso LXXVIII, é respeitado de forma incontestável pela JMERS, pois a celeridade processual é uma realidade tanto no primeiro grau de jurisdição, como no segundo grau, sempre observando-se o caso concreto.

Complemento, grifando que esta reflexão histórica teve por objetivo principal retirar a poeira do tempo que paira sobre os diversos atos, regulamentos, decretos e leis, sem os quais não chegaríamos ao estágio atual da Justiça Militar do Estado do Rio Grande do Sul. A linha do tempo desta história, em conjunto com o aperfeiçoamento legislativo e somado ao esforço de honrados, dedicados, altruísta e dignos magistrados e servidores da Justiça Militar do Rio Grande do Sul, foi a argamassa que possibilitou chegarmos aos 175 anos, prestando uma jurisdição eficaz e efetiva.

Finalizo, afirmando que a Justiça Militar Estadual, para além da prestação jurisdicional, essencial num estado democrático de direito, tem um papel educativo e pedagógico, contribuindo para o controle da ação do policial militar e do bombeiro militar.

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