Amilcar Macedo é o Juiz-Relator da Apelação criminal do caso Kiss
Segundo a Procuradora de Justiça Maria Ignez Franco Santos que examina os autos do processo, ainda neste mês de outubro de 2015 ele deverá estar nas mãos do Juiz-Relator.
A fase de instrução na Auditoria de Santa Maria da Justiça Militar (1ª instância) foi iniciada em 23 de agosto de 2013. O julgamento ocorreu nos dias 2 e 3 de junho de 2015.
No dia 25 de setembro de 2015, o Juiz-Presidente do Tribunal de Justiça Militar gaúcho Sergio Antonio Berni de Brum, acompanhado da Procuradora de Justiça Maria Ignez Franco Santos, acompanhou o ato de “distribuição eletrônica” da apelação criminal referente aos recursos interpostos pelas partes envolvidas no caso Kiss, processo julgado em primeira instância na Auditoria de Santa Maria da Justiça Militar. O feito já foi encaminhado ao Ministério Público para parecer e após irá para o Juiz do Tribunal apontado como relator por distribuição eletrônica Dr. Amilcar Fagundes Freitas Macedo que, na composição do Pleno do TJM/RS é juiz civil da Corte, nomeado por indicação do Ministério Público do Estado. O Juiz Revisor apontado pelo mesmo sistema eletrônico é Antonio Carlos Maciel Rodrigues. São 127 volumes, 18 mil laudas de processo e 173 laudas da sentença de primeiro grau.
O caso Kiss na Justiça Militar
Ocorrida há pouco mais de dois anos, a “Tragédia na Boate Kiss”, que vitimou 242 jovens na cidade de Santa Maria, região central do Rio Grande do Sul, ainda emociona e mexe com a população do Estado. O julgamento dos bombeiros indiciados pelo Ministério Público já aconteceu no 1º grau da Justiça Militar gaúcha.
A tragédia
A madrugada do dia 27 de janeiro de 2013 ficará para sempre na memória dos gaúchos. Por volta das 2h30min, um artefato pirotécnico foi aceso durante o show que acontecia na casa noturna Kiss, em Santa Maria/RS. As fagulhas atingiram e consumiram com rapidez o isolamento acústico do teto da casa superlotada e dotada, segundo especialistas, de saídas insuficientes. Em três horas, os 638m² da boate seriam devorados pelo fogo. Como consequência, 235 pessoas morreram no dia do incêndio, a maioria por asfixia, em decorrência da inalação de fumaça tóxica ou pisoteada. Outros sete jovens viriam a falecer por complicações respiratórias nos meses seguintes. Ao final, 242 vítimas perderam a vida e outras 116 ficaram feridas na maior tragédia do Estado do Rio Grande do Sul e uma das maiores do país.
O inquérito
O inquérito policial ultrapassou a marca de 10 mil páginas, contendo 25 volumes na parte principal, com depoimentos de mais de 800 pessoas e 24 volumes de anexos, com o resultado de perícias, fotos, vídeos e outras provas colhidas durante a fase de perscrutação, que apontou vários responsáveis pelo acidente, embora nem todos tenham sido denunciados pelo Ministério Público à Justiça. A investigação constatou, ainda, diversas irregularidades na concessão de documentos e na fiscalização da casa noturna, sendo do Corpo de Bombeiros algumas daquelas atribuições, pelo que foi instaurado inquérito policial militar para apuração de fatos que fossem tipificados na lei como crime de natureza militar. O inquérito foi remetido à Justiça Militar em 11 de abril de 2013 que deu vistas ao Ministério Público, que ofereceu denúncia. A fase de instrução processual na esfera castrense foi iniciada em 23 de agosto de 2013.
Cinco praças do Corpo de Bombeiros - dois sargentos e três soldados - foram indiciados por crime previsto no artigo 324 do Código Penal Militar (CPM); e três oficias foram indiciados por crimes previstos no artigo 312 do CPM - um tenente-coronel, hoje na reserva, que comandava a Sessão de Prevenção a Incêndio (SPI) na época; um tenente-coronel, na época comandante do 4º Comando Regional de Bombeiros (4º CRB); e um capitão do Corpo de Bombeiros, responsável por assinar um dos alvarás da casa noturna -, tendo o comandante do 4° CRB sido indiciado, também, por crime previsto no artigo 319 do CPM.
Sob juízo da magistrada Viviane de Freitas Pereira, o Conselho Especial de Justiça foi composto pelos Coronéis da Brigada Militar (Polícia Militar do RS) Humberto Teixeira Santos, Fernando Alberto Grillo Moreira, Gleider Cavali e Elizeu Antonio Vedana.
Os julgamentos
Após a fase de instrução processual, encerrada em 23 de abril de 2015, a Juíza Viviane de Freitas Pereira determinou os dias 2 e 3 de junho para o julgamento, no plenário daquela Auditória.
O julgamento aconteceu em duas partes, sempre com plenário completamente lotado pelos familiares, imprensa e representantes da comunidade santa-mariense. No primeiro dia, foram julgados os três oficiais e, no segundo, os cinco praças. As sentenças de todos os réus foram lidas no segundo dia.
Dois anos e quatro meses depois da tragédia, em momento de grande tensão e comoção, o primeiro veredicto do “Caso Kiss” foi proferido na Justiça Militar. O Conselho Especial decidiu pelas condenações do ex-comandante do 4° CRB e do capitão do CB, ambos pelo crime de inserção de declaração falsa em documento (tipificados no art. 312 do Código Penal Militar), à pena de um ano de detenção, com direito a sursis bienal. E, ainda, condenou a mais seis meses de detenção o ex-comandante pelo crime de prevaricação (art. 319 do CPM). Já o ten.-cel. que comandava a SPI na época da tragédia foi absolvido das acusações (tipificadas no art. 312 do CPM). Os cinco praças, conforme requerimento do Ministério Público, foram absolvidos do crime de inobservância da lei (art. 324 do CPM). Agora o Tribunal vai julgar os recursos cabíveis interpostos pelas partes.
A atuação da Justiça Militar gaúcha
O Juiz-Presidente do Tribunal de Justiça Militar do Estado do Rio Grande do Sul, Cel. Sergio Antonio Berni de Brum; e a Juíza de Direito Titular da 3ª Auditoria da Justiça Militar do Estado em Santa Maria, Dra. Viviane de Freitas Pereira, falam sobre a atuação desta justiça especializada no caso.
A celeridade da justiça especializada neste processo foi comentada pelo Juiz-Presidente, ainda que com reservas: “Eu preferia não estar me referindo ao ‘Caso Kiss’ para exemplificar a característica de celeridade da Justiça Militar”, disse. E declarou não citar rotineiramente o caso em respeito às vítimas, familiares e amigos, mas lembra que não há como ignorar um fato tão marcante. “Santa Maria e todo o Rio Grande do Sul estão traumatizados com a tragédia – e ainda estarão por muito tempo. Mas, por outro lado, penso que, de certa forma, a atuação da Auditoria da JME/RS em Santa Maria e agora do Tribunal, em grau de apelação, é uma homenagem aos familiares e amigos das vítimas. Está sendo um trabalho intenso, respeitoso, diligente e cuidadoso que culminou no mais rápido julgamento do ‘Caso Kiss’ em primeiro grau e, certamente, será ainda mais célere nesta Corte”, lembra o magistrado.
Por fim, Brum destaca que, enquanto os primeiros resultados do caso começam a sair da Justiça Comum, o processo na Justiça Militar já está no TJM/RS em grau de recurso. E afirma: “Aqui no Tribunal, o caso está tendo o mesmo tratamento que teve no 1° grau e ainda com mais celeridade”, ou seja, estamos cumprindo a recomendação do CNJ em relação à razoável duração do processo..
Juíza condutora do feito fala sobre o caso Kiss na Justiça Militar
Viviane de Freitas Pereira, juíza responsável pelo processo, fala das peculiaridades desta prestação jurisdicional:
“No exercício da jurisdição há quase 16 anos, posso afirmar, sem medo de errar, que o Processo Crime nº 1429-79.2013.9.21.0003 foi o mais difícil que julguei, considerando-se, em especial, o contexto fático que o originou. Embora o Ministério Público em atuação junto à Auditoria Militar de Santa Maria tenha afastado qualquer nexo de causalidade entre a atuação dos bombeiros militares denunciados e as 242 mortes ocorridas em virtude do trágico incêndio, o feito ficou conhecido e ganhou repercussão nacional, quiçá internacional, como “processo da boate Kiss”. Tendo-se em vista que a legislação penal militar prevê penas baixas para as imputações que foram descritas na denúncia – o que gerou curtos prazos prescricionais-, este juízo e o Conselho Especial de Justiça, juntamente com os comprometidos servidores lotados na Auditoria, empenhou-se em garantir a regular e rápida tramitação do feito, o que, por óbvio, não era tarefa fácil. Por ocasião do Julgamento, o processo contava com mais de 18 mil laudas, assim como com inúmeros anexos. Além da dedicação ao estudo do feito que era extremamente extenso, foi preciso analisar diversas questões técnicas, o que desencadeou um aprofundado exame de legislação esparsa. Na condução do feito foram adotadas medidas que facilitaram a rápida instrução: O Conselho Especial de Justiça deslocou aos municípios de Porto Alegre, Capão da Canoa e Caxias do Sul, com o intuito de inquirir testemunhas. Por outro lado, a pauta de audiências sempre foi marcada em acordo com os Defensores e Ministério Público, evitando-se, com isso, pedidos de transferências. Assim, foi possível, após cerca de um ano e dez meses do recebimento da denúncia, julgar as imputações atribuídas aos bombeiros militares e fazer a entrega da devida prestação jurisdicional por meio de sentença em 173 laudas.”.